sexta-feira, 21 de março de 2014

XV - UMA CAÇADA ESPECIAL

-FARDA OU FARDO?-
Patrulhas sucessivas, consubstanciadas principalmente nas deslocações ao Dirico e Calai, para abastecimento de combustível e nas ações de caça, único alimento substancial, normalmente de gazelas ou gnus, quer por serem os mais abundantes quer pelo sabor excelente da sua carne. Numa dessas incursões, deparamo-nos com uma manada de centenas de búfalos, em terreno aberto, em corrida, naquela savana imensa, a uns trezentos metros. Avistando-nos, pararam e, numa atitude de autodefesa, colocaram-se em linha, virando-se para nós. Estancámos os Unimogues e ficamos a observar, receosos que, nessa disposição defensiva, arrancassem em correria. Ficaríamos em massa disforme. Mas não, recolocaram-se em fila indiana e retomaram a marcha. Recompostos e aliviados do susto, dirigimos as viaturas para o fundo da manada na tentativa de isolarmos um animal, mas sempre atentos à reação dos restantes. A dado momento, um casal, macho e fêmea, foi ficando para trás, provavelmente já cansadíssimos. Virámos então as viaturas na sua direção, lateralizando-os, e tentando modificar o sentido da sua marcha, em galope. Assim aconteceu. Viraram para trás e continuaram a sua correria louca … mas estavam já isolados. O resto da manada seguiu o seu destino. A dado momento, o macho, provavelmente não aguentando mais aquela aceleração, parou e começou aos urros, assustadores. Deixámos a fêmea continuar a sua correria e concentrámo-nos naquele bicharoco, mais pujante, logo, mais pesado, mais carne, portanto. Ficamos expectantes e olhamos em redor. Nem uma árvore de grande ou médio porte, onde nos pudéssemos refugiar para uma eventual situação reativa. Passados uns cinco minutos, talvez já recomposto e sentindo-se acossado, vemos repentinamente aqueles seiscentos quilos de carne abaixar os cornos, num berrar horrendo, e correr na nossa direção, perpendicularmente à posição dos Unimogues. Ficamos estarrecidos pois ele derrubaria a viatura por si selecionada e desfaria por completo quem lá fosse instalado. Já a uns dez metros de proximidade, o João Silva (irmão dum conhecido escritor e jornalista desta praça, César Príncipe, e que viria a exercer a profissão de Delegado de Informação Médica) dá um alto berro para o condutor: - ”arranca!”. O bicho deverá ter-se assustado com o grito e deu uma volta de 90º, mas sempre em correria. Ficamos amarelos, brancos, sem pinta de sangue. Mas já que éramos duma Companhia de Caçadores … aí vamos nós novamente na sua peugada. Ele já não deveria aguentar mais, porque estancou a espumar-se abundantemente. Combinámos o ponto onde deveria levar o tiro, na parte superior da pata esquerda da frente, e então abrimos fogo simultaneamente. Ele caiu, aos berros, e, como já não poderia levantar-se, aproximamo-nos, já apeados, e demos-lhe o tiro de misericórdia.
NA BALANÇA DE CAÇA GROSSA DA COUTADA DEU 623 KGS
E agora, como o transportar? Como se pega num peso daqueles e como o levamos? O desenrascanço tipicamente portuga logo emergiu: amarrámos o guincho duma das viaturas à cabeça do animal, travado pelos cornos, e fomo-lo arrastando para junto de uma árvore com sustentação razoável. Desmontámos o banco de um dos Unimogues e colocámo-lo transversalmente à frente, junto à chapa de separação do condutor. Encostámos essa viatura à árvore já escolhida. Passámos o guincho por cima dessa árvore e fomos içando, devagarinho, aquelas centenas de quilos. O Unimogue foi-o recebendo no seu seio muito devagar até ficar estabilizado. Algum pessoal passou para a outra viatura, apertando-se um pouquinho, e o restante sentou-se no dorso do nosso troféu.

E lá calculámos o azimute correto, quais patrulheiros em serviço, rumo ao Aquartelamento, sem captura de Inimigos, mas com uma peça especial de iguaria.


Carlos Jorge Mota

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