-FARDA OU FARDO?-
Em princípios de agosto de 1970, somos informados que iríamos ser
rendidos. Outras paragens, ainda ignoradas, nos eram agora destinadas.
Começa-se os preparativos para entrega de todos os materiais, com exceção de
viaturas e do armamento, e a passagem do testemunho. A fim de possibilitar uma
interligação mais eficaz e um adequado contacto com a nova realidade,
nomeadamente um melhor conhecimento das caraterísticas do terreno, potencialidades
aproveitáveis, perigos e, principalmente, pontos mais sensíveis, havia sempre
um tempo de sobreposição. Chega o primeiro grupo, que percorreu o trajeto que
tínhamos utilizado na nossa ida para aquelas paragens. Boas-vindas aos noviços,
de olhos perscrutantes, olhar revelador de muita e compreensível
intranquilidade face ao início da sua Guerra.
Branquinhos, tez ainda não mudada e moldada ao calor tropical, logo, maçariquitos recém-desembarcados,
concluímos de imediato. Adestramento acelerado no que ficaria em sua posse,
patrulhamentos em conjunto pois a experiência é grande mestra. Assisto a uma
interjeição surreal: um Soldado novel avista um seu conterrâneo e dispara: “oh Luís, que estás aqui a fazer?”. O
absurdo seria ridículo se o estado de alma fosse normal.
A transferência de Unidades normalmente é feita em duas fases, mas,
neste caso, não se trata duma rotação porque a nova Companhia acaba de chegar à
RMA. Todavia, a nossa deslocação é para efeito de rotação, portanto, sujeita ao
procedimento habitual, isto é, metade de cada vez. Irei na segunda metade.
Avança a nossa primeira, mas com percurso diferente do utilizado na
vinda, isto é, seguindo a picada mais a leste, via nosso Destacamento do
Luengue - a ser rendido também -, logo, em áreas de maior preponderância de
forças Inimigas, segundo informações recolhidas. Segue também um Grupo de GE’s,
como reforço. Abraços aos que partem, por uma despedida temporária, até ao
reencontro. Para os “nossos”, até Serpa Pinto, onde nos aguardarão; para os novatos,
até ao Luengue, pois avança já um Grupo de Combate deles para render o nosso
Grupo que lá está e se sobreporá com ele até à chegada da nossa segunda metade
àquele Destacamento, Grupo nosso esse que se juntará depois a nós a fim de
seguirmos em coluna única, rumo à Capital do Kuando-Kubango.
O GLÓRIA E OS GE'S NA PRIMEIRA METADE. O AUTOR, SÓ PARA MEMÓRIA FUTURA |
Metem-se ao caminho, como tantas e inúmeras vezes
antes, mas, desta, uma surpresa estaria reservada.
Carlos Jorge Mota
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